Subiu para 21 o número oficial de mortos na passagem de um ciclone extratropical pelo Rio Grande do Sul. Milhares de pessoas foram afetadas e municípios ficaram ilhados.
A correnteza arrastou, pelo menos, dez casas no município de Santa Tereza, na Serra Gaúcha. A rapidez e a força da água surpreenderam os moradores.
“Estou me sentindo muito mal, muito, muito. Porque eu tenho 76 anos, trabalhei uma vida inteira para gente ter. Nós tínhamos uma casa super boa, não faltava nada, e se foi”, lamenta a aposentada Lúica Maria Chiminazzo.
O pedreiro Ademir Villa perdeu tudo. Ele, que vive de construir casas, não sabe como reconstruir a vida dele. A repórter pergunta: “A sua casa, tem como recomeçar?”. E Ademir responde: “Não, não tem como”.
Em Santa Tereza, o Rio Taquari começou a baixar na tarde desta terça (5). O cenário é de destruição. De segunda-feira (4) para esta terça-feira (5), a situação piorou muito. Na segunda, a Defesa Civil registrou 42 municípios atingidos. Nesta terça, o número já subiu para 67.
O trânsito na BR-386, principal ligação entre a capital gaúcha e o norte do estado, foi interrompido no início da manhã. Em um trecho, o Rio Taquari cobriu todas as pistas da rodovia. Nenhum carro e nem caminhões conseguiam passar.
“Sem condições de passar aqui. Temos que ficar parado, esperando ver o que vai acontecer”, diz o caminhoneiro Volmir Loreni.
Os municípios de Lajeado e Estrela, que são separadas pelo Rio Taquari, estão debaixo d’água. Em um ponto, o rio chegou a 29,59 m – 17 m acima do nível normal. É o segundo maior índice da história, só perde para a enchente de 1941.
Ainda na região do Vale do Taquari, moradores de Roca Sales ficaram ilhados e precisaram ser retirados de helicóptero.
Uma família com um bebê de colo ficou no telhado da casa a espera da chegada da equipe de resgate.
A 20 km dali, o município de Muçum também está debaixo d’água. Desde segunda-feira (4) o acesso à cidade está interrompido. Esta tarde, a Defesa Civil e o Corpo de Bombeiros conseguiram chegar ao local e encontraram 15 corpos. O total de mortos no estado chega a 21.
“Eu quero assegurar à população que a gente está trabalhando com toda dedicação. Falei hoje de manhã com o ministro da Defesa, com o ministro da Integração, o secretário nacional da Defesa Civil. Os prefeitos estão atuando, voluntários atuando nos municípios para ajudar nos resgates, na atenção, as famílias em cada um dos municípios, especialmente aqui no Vale do Taquari”, afirma Eduardo Leite, governador do Rio Grande do Sul.
A Defesa Civil contabiliza mais de 1,6 mil moradores desabrigados e outros 3 mil desalojados no Rio Grande do Sul. As fortes chuvas também chegaram a Santa Catarina. Em Chapecó, a ventania de segunda causou queda de energia. Segundo a Celesc, só na cidade foram mais de 3.500 interrupções acidentais.
Durante a manhã desta terça, a situação já havia sido normalizada. À tarde, a concessionária focou os esforços em reparos, principalmente, em áreas rurais de outros municípios. Em Jupiá, no oeste do estado, uma pessoa morreu devido à queda de uma árvore.
Em uma rede social, o presidente Lula prestou solidariedade aos moradores e ofereceu ajuda do governo federal. Nesta quarta-feira (6), os ministros Waldez Góes, do Desenvolvimento Regional, e Paulo Pimenta, da Secretaria de Comunicação Social, viajarão até o Rio Grande do Sul. Em toda a região, famílias ainda calculam o tamanho das perdas.
“Estou com 63 anos de idade e eu não me lembro, não cheguei a perceber ver uma enchente assim como essa não. Essa é terrível realmente. Passo diariamente aqui, nunca vi igual. É lamentável a perda que o pessoal está tendo com animais e plantações também, e vida. Principalmente vidas”, diz o agricultor Moacir Martins de Souza.
“Foi uma surpresa, a gente não esperava tanta água assim. Começou a subir, subir. Aí veio caminhão, começou a carregar as coisas. Eu digo: se foi a nossa casa. Agora para começar tudo não é fácil”, conta o agricultor Eugênio Villa.
Dificuldades a caminho de Estrela
O repórter Cristiano Dalcin tentou chegar à cidade de Estrela, que foi muito atingida. Da estrada, ele mandou um relato das dificuldades que encontrou no caminho.
De cima de um barranco na BR-386 – rodovia que liga Porto Alegre à cidade de Estrela de Lajeado, onde o repórter tentou chegar desde o início da tarde desta terça (5) e não conseguiu.
Ele e a equipe buscaram caminhos alternativos, outas BRs, desvios, mas em todos eles os rios transbordaram e invadiram as pistas das estradas. O local onde o repórter estava, na BR-386, não tinha energia elétrica, apresentava sinal fraco de celular, e dezenas de caminhões estacionados desde o início da manhã de terça, quando o caminho da BR-386 foi interrompido pelo avanço do rio.
Um dos caminhoneiros que conversou com o repórter disse estar a 15km de casa, da cidade de Arroio do Meio, onde está a família dele, ilhada. O caminhoneiro disse não ter comunicação com a família, diante do sinal fraco de celular. E, entre os familiares, ninguém atende.